Marcos Lutz Müller. Homenagem do PPGFilosofia

MARCOS LUTZ MÜLLER (1943-2020):
Um grande hegeliano brasileiro
 
 
Neste dia 15 de setembro de 2020 nos deixou o Prof. Dr. Marcos Müller, destacado representante da Filosofia da Unicamp. Foi meu professor de pós em duas ou três disciplinas, e finalmente meu orientador e querido amigo. A ele devo minha acolhida na Pós de Filosofia da Unicamp, na sua primeira turma de Filosofia Política, de espartana e prussiana fama (pós iniciada pelo grande Porchat, como de Lógica e Epistemologia), em dobradinha informal com a USP. 
 
Se não me engano, fomos César Ramos e eu os primeiros orientandos de sua carreira docente. Marcos, com 12 anos de Alemanha, casado com a também querida colega Jeanne-Marie Gagnebin, foi orientando do - também, mais tarde, nosso amigo - internacionalmente reconhecido filósofo, Ernst Tugenhat. Marcos foi um extraordinário e rigoroso estudioso de Hegel, de cuja Filosofia do Direito produziu uma soberba, laboriosíssima, memorável tradução (edição crítica, na verdade; acho que a melhor, para qualquer língua), além de um estudioso sofisticado de Marx, de Habermas e mais. Marcos, que publicou relativamente pouco, impressionava, não só por sua inteligência arguta e exemplar competência acadêmica, mas também por sua generosidade, cordialidade e integridade. 
 
Por demais exigente em primeiro lugar consigo mesmo, ao ponto de certa inibição intelectual, não se permitiu voos de pensamento próprio - salvo nas conversas fora da aula, quando, falando filosoficamente da conjuntura política nacional, seu pensamento de bem formado filósofo social e político aparecia, para nossa (dos alunos) surpresa e deleite. Mas Marcos não tolhia aos seus orientandos os voos para além da exegese do texto filosófico do Autor canônico, resguardados o rigor e o esmero técnicos. Incentivava. 
 
Com Marcos - finda a ditadura e assim apaziguado meu foco exclusivo na militância democrática e social - comecei o mestrado, sob sua confiança (que já na Alemanha conhecera minhas publicações políticas militantes), e sob a justificada desconfiança (do militante) de outros professores. Tendo eu, por isso mesmo, passado, no decorrer de um extenso e empenhado trabalho de pesquisa e redação, sem mestrado, diretamente ao doutorado - minha resposta e meu reconhecimento práticos a sua generosa aposta. Seu falecimento me deixa cheio de tantas outras recordações em que ele aparece - todas elas saudosas, ternas, admiradas e gratas. Uma memória, a sua, a ser cultivada e honrada por todos nós que tivemos o privilégio de ser seus alunos ou orientados - e amigos. 
 
Nesse momento doído, mosso abraço solidário aos colegas da Unicamp, a Jeanne-Marie e às filhas do casal.
 
José Crisóstomo de Souza
Professor Titular do Departamento de Filosofia da UFBA